As sociedades, em especial as ocidentais, vivem, após 30 anos do fim de vários regimes ditatoriais, uma crise na democracia, que deixa seu papel de regime político dominante e recolhe-se para dar lugar à ascensão de uma onda de extremo conservadorismo. Tal sucessão cíclica deve-se ao movimento dialético, que preside às mudanças naturais, culturais e políticas. Nessa direção, os que acreditam na democracia devem agir, não de maneira radical, mas de modo firme e constante, para impedir que predomine o autoritarismo.
Ao fim da Guerra Fria, em 1991, instalaram-se a pós-modernidade, a globalização e o neoliberalismo, o que significou as forças do mercado substituírem o Estado na regência dos aspectos econômicos, ocupando-se o Poder Público dos sociais e dos políticos. Assim, o mercado esvaziou os valores humanistas, como o necessário equilíbrio entre os interesses individuais e os coletivos e a relação ética entre os cidadãos. Como decorrência, intensificaram-se a imigração, o hiperindividualismo e a simplificação das complexas diferenças sociais — tornando invisíveis os mais carentes —, aspectos que determinaram a crise dos partidos políticos e esvaziaram a democracia representativa.
Esse quadro deveu-se à dinâmica dialética, na qual ocorre a seguinte interação entre duas polaridades opostas e complementares: enquanto uma domina e determina as ações da coletividade, a outra recolhe-se e dá espaço ao domínio de sua oposta e, assim, sucessivamente, em ciclos contínuos. Citemos o Brasil: em 1964, instalou-se uma ditadura militar. A partir de 1985, o povo, novamente, pôde votar em governos civis e, em 1988, redigiu-se a Constituição Cidadã, ainda vigente. O ciclo desse modelo declinou-se nos anos 2010 e impactou as eleições presidenciais em locais como Estados Unidos, Reino Unido e Brasil, cujos governos vêm retomando o autoritarismo.
Nessa direção, é indispensável que as instituições e os segmentos sociais que defendem a democracia criem estratégias, não de ataque, mas de prevenção a decisões autoritárias. É o que vem ocorrendo no Brasil — segundo o site da Câmara dos Deputados, os parlamentares vêm-se articulando para derrubar o veto presidencial à obrigatoriedade do uso de máscaras em shoppings, lojas etc. Outro exemplo foi a medida provisória de Bolsonaro que desobrigava as empresas de publicar seus balanços em jornais impressos. O Congresso decidiu nem a votar, o que a fez perder a validade. Segundo os parlamentares, a intenção do presidente foi prejudicar a parte da imprensa com que mantém briga constante.
Como se vê, a dinâmica dialética preside a nossos movimentos individuais e coletivos. Tal noção de mundo mostra-se essencial para que conheçamos o equilíbrio da natureza e que o reflitamos em nossa cultura. Com certeza, essa consciência influencia-nos a agir como cidadãos mais ativos e participantes dos rumos de nossa vida e da sociedade.
Cimara Prada, professora
Fonte: https://www.atribunapiracicabana.com.br/2020/07/10/dialetica-e-crise-na-democracia/