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No último dia 07 de maio fomos surpreendidos, em plena pandemia mundial de Covid 19, pela violenta reintegração de posse da área ocupada pela comunidade Taquaral, na região do Bairro Monte Líbano. Para além da barbárie perpetrada pelo Estado, com dezenas de famílias despejadas e despojadas de seus precários lares em meio a um cenário de crise sanitária, em que a todos é pedido para se manterem em isolamento social, trancados em suas casas, nos chama a atenção o fato da favelização ainda ser um fato tão presente na cidade.
A Comunidade Taquaral era apenas uma – e a mais recente – dentre muitas dezenas de favelas e ocupações existentes em Piracicaba. Estima-se que aproximadamente 10% da população piracicabana viva nessas condições precárias e juridicamente inseguras.
Mais impressionante que o próprio cenário dessa favelização persistente é o fato de que, ao longo dos últimos anos, Piracicaba foi um dos municípios com maiores índices de produção imobiliária do estado de São Paulo. O município figura no topo dos rankings de novos loteamentos e também quanto à implantação de empreendimentos do Programa Minha Casa Minha Vida (PMCMV). Como explicar, então, o fato de tantos piracicabanos ainda viverem em favelas e, inclusive, elas estarem em franca expansão?
Isso se explica, em parte, devido à própria lógica do mercado imobiliário: os produtos construídos nas duas últimas décadas não se destinavam a essa população carente, justamente aquela que mais necessita de políticas habitacionais para ter atendidas suas necessidades por moradia.
Dados do Ministério do Desenvolvimento Regional mostram que a produção de moradias do PMCMV aqui foi uma das mais expressivas do estado, totalizando quase 30 mil unidades. Porém, aquelas famílias de mais baixa renda (Faixa 1), onde se concentra a maior porção do chamado déficit habitacional, e para a qual o PMCMV disponibilizava uma série de necessários e importantes subsídios, foi a menos privilegiada nessa produção.
Isto porque os empreendimentos para a Faixa 1 demandam contrapartidas do poder público municipal para serem efetivados, necessitando, por isso mesmo, uma política habitacional municipal coerente e competente, o que não se verifica há tempos.
A Prefeitura do Município de Piracicaba há muito não é capaz de apresentar um diagnóstico confiável acerca das necessidades habitacionais de sua população: não temos informações precisas sobre o número de favelas, quantas pessoas nelas residem nem qual a situação dessas populações. O que sabemos é que, em paralelo a esse boom imobiliário, elas cresceram, se adensaram e novos núcleos surgiram. Quanto às propostas para a habitação de interesse social, pouquíssimas foram as iniciativas e, quando vieram, trouxeram mais problemas que soluções.
Em 2017 a administração municipal investiu fortemente na aprovação da Operação Urbana Corumbataí, empreendimento imobiliário no extremo norte da cidade, em área de reconhecida fragilidade ambiental, fato reconhecido pelo próprio poder público que assim nomeou a área no zoneamento urbano. A área, até aquele ano rural e ocupada por canaviais, foi incluída no perímetro urbano, permitindo a edificação de 3.500 moradias no local. Para além do evidente impacto ambiental – e social – envolvido em tal operação, tal medida não oferecia nenhuma resposta às reais necessidades por moradia do município, uma vez que o empreendimento não se destinava às famílias mais pobres e residentes nos núcleos de favelas, que se enquadravam na Faixa 1 do PMCMV. Como informado por representante da Prefeitura em audiência na Câmara de Vereadores sobre o projeto, as moradias estavam enquadradas na chamada Faixa 1,5, inadequada para atender aqueles piracicabanos que compõem a demanda por moradia.
Uma ação do poder público municipal que poderia ter produzido uma cidade mais justa, sustentável e democrática teria sido a regulamentação dos instrumentos do Estatuto da Cidade para combater a especulação imobiliária, algo que esperamos desde 2006, quando da aprovação do Plano Diretor de Desenvolvimento Sustentável de Piracicaba (LC 186/2006)… em vão.
Em lugar disso, assistimos a seguidas expansões do perímetro urbano, que só produziram mais e mais vazios, que permanecem desocupados à espera de valorização imobiliária, resultando em custos sempre maiores e já intoleráveis para toda a sociedade piracicabana.
Manifestações hipócritas de solidariedade não tem valor algum para quem perdeu sua casa, para quem vive precariamente nas favelas piracicabanas, ou para quem tem um mínimo de caráter e responsabilidade social!

Autores:
Estevam Otero – arquiteto e urbanista, doutor em Planejamento Urbano e Regional
Sílvia Maria Morales – engenheira civil, mestre em Urbanismo
Sabrina Mac Fadden – advogada, especialista em Direito Ambiental

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